São Paulo Webinar

Lei da Igualdade Salarial: desafios e reflexões sobre a equidade de gênero no mercado de trabalho

Webinar da Comissão Legal analisa relatório do Ministério do Trabalho e Emprego e as perspectivas para as empresas no Brasil

 

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) determina que empresas com mais de cem funcionários prestem informações sobre seus quadros para fiscalização da desigualdade de remuneração entre gêneros. Com as informações, preenchidas em cumprimento à Lei da Igualdade Salarial, o MTE produziu um relatório que deverá ser publicado pela empresa até 31 de março em suas redes sociais, site ou canais que garantam a ampla divulgação para seus empregados, trabalhadores e público em geral.

No dia 21 de março, a Comissão Legal esclareceu pontos desse relatório no webinar “Lei de igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens – regulamentação e aspectos práticos”. Os palestrantes convidados foram Érika Seddon, Sócia no Mattos Filho, e Cleber Venditti, Partner at Mattos Filho.

O evento teve a mediação da Vice-líder da Comissão, Thais Arza Monteiro, e a participação do Líder, Philippe Boutaud-Sanz.

Para Venditti, “a Lei da Igualdade Salarial busca consertar uma realidade brasileira. Os dados mostram que as mulheres ganham menos do que os homens no mercado de trabalho”, afirma. O relatório apresentado pelo Ministério do Trabalho e pelo Ministério das Mulheres apresenta indicadores de salário, a razão na remuneração homens/mulheres e critérios para definição de salário mediano, salário mediano de admissão e salário médio. Esses indicadores são avaliados à luz da relação entre os dados demográficos e os da empresa, como a quantidade percentual de mulheres e homens que compõem a sua força de trabalho. Neste momento não são levadas em consideração informações estatísticas sobre mulheres não negras, mulheres negras, homens negros e homens não negros – “Esses dados servem como prévia à legislação apenas para fins estatísticos, mas não é sobre isso que o Governo está debruçado agora”, afirma o advogado.

Critérios insuficientes - Érika aponta alguns problemas no relatório. “No relatório que foi disponibilizado há poucos dias, não existia a informação do salário mediano de admissão, apenas o salário mediano contratual. A mediana é um critério que é válido para tentar entender se existe alguma discrepância no pagamento de salários entre homens e mulheres. É uma média aritmética do valor pago a um grupo. O problema disso é que qualquer coisa fora do padrão vai desviar a mediana, de forma que é um critério insuficiente para identificar a discriminação salarial”, critica. Outros itens também podem resultar em uma mediana incorreta: adicional de insalubridade, comissões, gratificações etc.

Outro problema, continua Érika, é que a Classificação Brasileira de Ocupações é ótimo critério para identificar a diferença de salário entre gêneros. Porém, ela foi criada para fins estatísticos, sem obrigação de aplicação para leis de emprego. Por isso, é possível que os relatórios apresentem distorções por conta da imprecisão na utilização das CBOs. Um exemplo é que só existe uma CBO para advogados, como se todos precisassem receber o mesmo salário, tivessem a mesma função e o mesmo tempo de serviço. “Se o empregador se atenta a esses requisitos de equiparação salaria, ele não comete nenhum ato discriminatório. No relatório, o problema é abrigar grupos tão distintos de uma forma única.” Outro ponto a observar são os fatores sociais. Em certas áreas de atuação, como Ciências ou Educação, por exemplo, é natural que haja mais presença masculina ou feminina.

Em relação à composição dos empregados, lembra Érika, não existe obrigação legal de a empresa ter a mesma proporção de mulheres e homens e pessoas negras e não negras. No entanto, explica, os dados precisam ser contextualizados. A publicação semestral do relatório permite acompanhar a evolução da empresa. Se a proporção de negros e mulheres não cresce, apesar do discurso e das metas ESG que ela almeja alcançar, fica claro que não foram adotadas medidas suficientes. A advogada comenta ainda que, à medida que o Ministério do Trabalho adquirir expertise na interpretação de dados, é possível que os relatórios solicitem mais detalhes, como idade e nacionalidade, por exemplo.

As empresas que forem notificadas pelo TEM por não cumprirem a igualdade salarial terão 90 dias para elaborar um plano de ação que contenha as medidas, as metas, e também como a empresa vai aferir o resultado das medidas e metas que se propôs.

Estratégias de divulgação – Para Venditti, as empresas precisam avaliar o conteúdo do relatório para definir sua estratégia. “Está errada a empresa que pensa que vai pegar o relatório e simplesmente divulgá-lo. Ela precisa pensar em como fazer isso, porque pode haver diversos cenários. O pior deles é um relatório que mostra uma fotografia ruim ou distorcida da minha realidade e que me força a apresentar ao governo um plano de ação envolvendo sindicatos, prazos e metas para buscar uma equidade. Tudo isso expõe a empresa ao julgamento público dos stakeholders e de todos os que lerem aquele documento”, observa. Ou seja, mesmo que a multa cobrada pelo MTE tenha valor considerável, ela é pequena diante da questão reputacional a que a empresa pode se expor.

O advogado relata que várias empresas estão entrando com ações preventivas para evitar a disponibilização do relatório. Uma saída, segundo ele, é contextualizar as informações apresentadas. “A contextualização dos dados pode ser uma ferramenta poderosa para mitigar possíveis impactos negativos, especialmente no que diz respeito à reputação da empresa. Além disso, a análise da base de CBO e a revisão de métricas de formalização de plano de carreira são medidas importantes para garantir a conformidade com a lei e promover a equidade de gênero internamente.” É essencial, portanto, que as empresas estejam atentas e proativas em relação a essas questões, buscando sempre melhorias contínuas em suas práticas e políticas internas - mesmo porque, lembra ele, outro relatório será produzido meses depois. “Não divulgar ou preferir pagar a multa é um equívoco e não resolve nada no longo prazo. A percepção pode ser de que ela tem algo a esconder.”

Outro cenário negativo é aquele em que as empresas sequer estão lidando com iniciativas para a igualdade salarial. Nesse caso, o primeiro passo é envolver os stakeholders para a definição de medidas que atendam as necessidades e interesses da companhia. Pelo menos três áreas são absolutamente relevantes nesse aspecto:  Recursos Humanos, Jurídico e Comunicação, além de áreas da matriz, caso seja multinacional. Nessa situação, observa Venditti, cabe contextualizar no relatório os planos globais da matriz e como eles se adaptam às determinações da legislação brasileira.

Assista o webinar completo: