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Brasil vai puxar avanço global da CNP

Seguro Grupo francês consolida reorganização societária e se prepara para iniciar operação independente no país

 

O Brasil vai puxar o crescimento do grupo CNP Assurances no mundo, afirma o CEO global da seguradora, Stéphane Dedeyan. Em entrevista ao Valor, o executivo aponta o país como um dos mercados com maior potencial de crescimento entre aqueles em que o grupo francês atua. “Investimos R$ 8 bilhões aqui nos últimos dois anos porque vemos muito espaço para desenvolver e progredir e, para nós, o Brasil é uma grande fonte de criação de valor no futuro”, afirma.

Segundo a companhia, a meta do grupo é crescer mais de 60% em termos de resultados no país nos próximos 10 anos. A CNP Brasil responde por 20% do faturamento da holding global e por 10% do lucro líquido total. Em 2021, que são os dados consolidados mais recentes, a filial brasileira arrecadou R$ 35 bilhões em prêmios de seguros e teve lucro líquido de R$ 2,7 bilhões. No mesmo período, a operação global registrou receita de 31,7 bilhões de euros e lucro líquido de 1,55 bilhão de euros.

A visita de Dedeyan ao país ocorre em um momento no qual a filial consegue as últimas aprovações de reguladores em relação ao movimento de criação da CNP Seguros, uma nova holding que vai administrar as empresas 100% controladas pelo grupo. Em 27 de janeiro, houve o fechamento (“closing”) da aquisição das fatias do banco estatal na Previsul e na CNP Capitalização, que alcançavam, respectivamente, 48,25% e 24,61%.

A última aprovação ocorreu na segunda-feira: a aquisição dos 49% detidos pela Icatu na CNP Capitalização. A seguradora francesa já tinha obtido a conclusão da compra a partir do aval dos reguladores, das participações da Caixa na CNP Consórcios e Odonto Empresas, que eram de 48,25% em cada joint venture. No total, para obter 100% do controle de todas as empresas, a CNP desembolsou mais de R$ 900 milhões.

Antes desse movimento, a holding global já havia pago à Caixa R$ 7 bilhões para a formação de duas novas joint ventures (JV), a Caixa Consórcio e a Caixa Vida e Previdência. As empresas nesse modelo têm direito de explorar o canal bancário do banco por 20 anos a 25 anos, respectivamente.

Por outro lado, com as incorporações da Holding Seguros, CNP Consórcio, Odonto Empresas, Previsul e CNP Cap, o grupo ganha autonomia para explorar o que o CEO global chama de “mar aberto”, ou seja, parcerias com outras instituições financeiras e novos canais de distribuição de produtos, como plataformas de varejo e corretoras. A criação da CNP Seguros também tem como objetivo deixar a marca do grupo mais conhecida no país. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Valor: Após a reestruturação societária e organizacional da CNP no Brasil, quais são os próximos passos para a companhia?

Stéphane Dedeyan: O Brasil é realmente um país estratégico para nós. Temos uma grande parceira, a Caixa Econômica Federal, mas agora também podemos operar com a marca CNP no país. A forma como fazemos negócios é a mesma em vários países do mundo. O modelo é combinar parcerias estratégicas. Por exemplo, na França, temos uma associação com o La Banque Postale, que é um dos 10 maiores bancos da Europa. E combinamos essa parceria estratégica com o que chamamos de modelo ‘mar aberto’, ou seja, de parcerias mais diversificadas. Esse modelo, nós temos na França, na Itália e, agora, vamos sair no Brasil também com uma operação 100% CNP.

Valor: No modelo de mar aberto, a CNP pretende fechar acordos de distribuição com outros bancos?

Dedeyan: Estamos avaliando novas parcerias, após concretizar os últimos ‘closings’ [para a constituição da holding CNP Seguros]. Quando a gente quando olha o modelo de mar aberto, a gente quer ser bem diversificado. Então, podem ser bancos públicos, privados, digitais, corretores e uma enorme gama de diferentes parceiros. No Brasil, queremos analisar as possibilidades no setor financeiro, varejo e agronegócio. A base da Caixa Econômica Federal tem cerca de 100 milhões de clientes. Mas o Brasil é um país enorme com 200 milhões de clientes. Nossa missão corporativa é levar os benefícios do seguro a todos os demais brasileiros que não são clientes da Caixa. Temos, por exemplo, uma parceria com a [seguradora digital] Youse e, quando olhamos para os novos clientes da Youse, 80% estão fazendo seguro de automóvel pela primeira vez.

Valor: Qual a importância da operação brasileira ao grupo?

Dedeyan: Se você pegar os países europeus, a penetração da atividade seguradora em relação ao PIB ronda os 10%. No Brasil, essa taxa é de menos de 5%. Então isso significa que há muito espaço para desenvolver e progredir. Para nós, o Brasil é uma grande fonte de criação de valor no futuro e vai puxar o crescimento do grupo CNP Assurances no mundo. E é por isso que investimos nos últimos dois anos R$ 8 bilhões na economia brasileira, sendo R$ 7 bilhões para a renovação da parceria com a Caixa e R$ 1 bilhão para a operação de mar aberto. É muito dinheiro, mas isso significa que estamos totalmente positivos sobre o Brasil.

Valor: O senhor. avalia ser possível um crescimento de dois dígitos do setor de seguros em 2023? 

Dedeyan: Quando olhamos para as tendências macroeconômicas, vemos um campo positivo para seguros. Além disso, cenários como os de mudança climática, segurança cibernética e, na maioria dos países, as pessoas estarem envelhecendo, essas tendências criam campo favorável para o desenvolvimento de seguro. No mundo, existem oportunidades de crescimento para a indústria. Mas achamos que esse ambiente é particularmente verdadeiro no Brasil. Diante de uma baixa penetração combinada com o cenário macro e as tendências de longo prazo, vejo possibilidade de um crescimento de 10% [no mercado brasileiro em 2023]. Talvez um pouco menos de 10%, mais para 8% ou 9%.

Valor: Qual operação tem maior potencial de crescimento, canal bancário ou mar aberto?

Dedeyan: No curto prazo, acho que o desenvolvimento dentro das parcerias com a Caixa ainda vai ser muito forte. Já faz mais de 20 anos que temos esse excelente relacionamento. Quando olhamos para a taxa de penetração do seguro na base de clientes da Caixa, achamos que há um enorme espaço para melhorias e desenvolvimento. Mas é bom ter o modelo de mar aberto, porque nos permite estar muito próximo do que há de mais interessante em termos de inovações.

Valor: O grupo tem metas específicas para o Brasil?

Dedeyan: Na nossa projeção, pensamos que a criação de valor futuro da CNP no mundo virá do Brasil. Temos uma visão de operar como um grupo global. Isso significa que você tem que fazer as equipes trabalharem juntas. Os times brasileiros vão contribuir com a estratégia da CNP no mundo.

Valor: Quais são as principais oportunidades em relação a produtos e tendências?

Dedeyan: No Brasil, para mim, há três tipos de oportunidades mais relevantes. A primeira é a distribuição de seguro pelo canal bancário, tanto o tradicional quanto o digital. Trata-se não apenas de financiar o projeto das pessoas, mas também proteger os projetos e a vida dos clientes. O modelo de distribuição bancária é muito poderoso e está ganhando participação de mercado. A segunda oportunidade é o seguro ‘embedded’ [embutido, em tradução livre]. Quanto mais o mundo se digitaliza, mais você precisa de um seguro embutido. Quando alguém reserva uma passagem de avião, facilita muito ter disponível um seguro ‘embedded’ de viagem, bagagem extraviada, atrasos ou cancelamentos de voos, por exemplo. Comprar algo em um marketplace digital também abre possibilidade de oferta de um seguro embutido. E uma terceira seria o canal dos corretores. Nesse caso, é uma abordagem de nicho. Os corretores têm um relacionamento próximos com os clientes sejam pessoas físicas ou empresas. Então eles trazem uma solução sob medida para esses consumidores.

 

Fonte: https://valor.globo.com/financas/noticia/2023/02/06/brasil-vai-puxar-avanco-global-da-cnp.ghtml