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Acordo entre Mercosul e UE é urgente, diz câmara francesa

‘Necessidade está cada vez mais evidente’, diz presidente da entidade em São Paulo

A adoção de tarifas contra todo o restante do mundo pelos Estados Unidos exige que as relações comerciais do Brasil sejam intensificadas. E um caminho para isso é a ratificação do acordo entre União Europeia e Mercosul, defende Thierry Besse, presidente da Câmara de Comércio França-Brasil de São Paulo (CCIFB-SP).

“Tudo o que vem acontecendo só torna, mais uma vez, evidente e necessário o aprofundamento da integração econômica entre União Europeia e Mercosul”, afirmou, Besse, um franco-brasileiro que é também diretor institucional da Vinci Concessions, operadora de aeroportos e rodovias. A entrevista ocorreu no dia 30, poucos minutos depois que o presidente dos EUA, Donald Trump, assinou o decisão de tarifar o Brasil em 50% e três dias após EUA e UE fecharam o acordo comercial com tarifa de 15% para a maior parte das exportações europeias.

“Precisamos, com urgência, avançar na integração desses blocos e, em particular, no que nos compete, nas relações entre França e Brasil, porque aqui há previsibilidade, confiança, visão de longo prazo e parceria”, disse.

Entusiasta do acordo UE-Mercosul, ele ressaltou que o pacto beneficiaria ambos os blocos e especialmente a relação comercial entre França e Brasil. “Esperamos uma ratificação rápida, porque o tempo está passando e a necessidade desse acordo está cada vez mais evidente.”

A CCIFB-SP é uma das quatro unidades regionais da Câmara de Comércio França-Brasil no país. A regional paulista reúne mais de 70% das 500 empresas associadas. A ampla maioria defende a ratificação do acordo UE-Mercosul, diz Besse.

O acordo criaria um mercado de mais de 750 milhões de consumidores, cerca de 10% da população mundial, e um Produto Interno Bruto de aproximadamente US$ 22 trilhões, cerca de 20% do PIB global.

Mas é da França que vem a maior resistência - embora haja possibilidade de mudança, dada a atual insatisfação do próprio presidente francês, Emmanuel Macron, e de outros líderes europeus com o recente acordo entre UE e EUA.

“O mundo parece cada vez mais turbulento e insano. Diante desse cenário desafiador para agentes econômicos fica claro que parcerias de longo prazo e relações de confiança são cada vez mais importantes. O que podemos constatar, a câmara é testemunha viva disso, porque acabou de festejar seus 125 anos, é que a relação França-Brasil é sólida”, disse Besse, sem comentar diretamente a decisão dos EUA.

“O investimento francês no Brasil e as relações comerciais se desenvolvem, de certa forma, independentemente dos próprios ciclos políticos. As empresas francesas investem no Brasil com visão de longo prazo, e isso é bastante saudável para a relação econômica entre os dois países.”

Para ele, os sinais são de manutenção e crescimento da relação. Besse diz que, apesar da volatilidade econômica brasileira, empresas e investidores franceses têm permanecido no país. Dados da Câmara apontam para 1,3 mil filiais de empresas francesas no Brasil, que, juntas, empregam mais de 500 mil pessoas e, em 2024, faturaram mais de € 61 bilhões (cerca de R$ 390 bilhões).

“Isso dá duas vezes o faturamento da Vale ”, que foi de R$ 206 bilhões em receita líquida em 2024, “ou quase o da Petrobras ”, que foi de R$ 490,8 bilhões no mesmo ano, “ou seja, um volume bastante significativo”, comparou Besse.

O presidente da CCIFB-SP disse que a relação econômica dos dois países vive momento positivo, com o Brasil se consolidando como destino “privilegiado” de investimentos franceses. “A França não está concentrada em uma parcela só dos setores econômicos. É um investimento que perfaz todos eles, da indústria aeronáutica, defesa, passando por varejo, infraestrutura, energia até luxo.”

Segundo o Banco Central (BC), a França é o terceiro maior investidor estrangeiro do Brasil, com estoque de US$ 66,3 bilhões, em 2023, atrás apenas da Espanha (US$ 66,7 bilhões) e dos EUA (US$ 272,8 bilhões). O país é ainda o segundo mercado emergente com mais investimentos franceses, atrás apenas da China, de acordo com a CCIFB.

Entre setores em que investimentos franceses têm sido mais presentes no país, ele destaca o de transição energética, em que empresas francesas têm atuação relevante, construindo e investindo em usinas solares, sobretudo no Nordeste, “mas não somente”, e em energia eólica.

Besse acredita que, embora o investimento francês no Brasil seja “muito forte, há muito tempo”, ainda há espaço para crescimento, sobretudo no fluxo comercial. Em 2024, ele foi de US$ 9,1 bilhões entre os dois países, montante considerado ainda “modesto” pela CCIFB-SP, e que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já disse ser “uma vergonha” dado o tamanho das duas economias.

Para Besse, o acordo UE-Mercosul pode impulsionar o fluxo, especialmente para pequenas e médias empresas, as PMEs, que enfrentam maior dificuldade para acessar mercados externos. “Há muito potencial ainda para a exportação de empresas francesas em direção ao Brasil e no sentido contrário”, diz.

O acordo, em um primeiro momento, diz, facilitaria exportações das PMEs, sobretudo as de base industrial - já que prevê a redução gradual de tarifas entre os blocos - e, depois, implantações locais, com novas unidades fabris, que “gerariam” mais emprego e renda.

 

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/08/05/acordo-entre-mercosul-e-ue-e-urgente-diz-camara-francesa.ghtml

 

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