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Entrevista ESG: “A bioeconomia nos permite aproveitarmos o potencial máximo dos recursos naturais agrícolas, aliando desenvolvimento econômico com menor impacto ambiental”

Diretor da Tereos, destaca o papel da bioeconomia e do setor corporativo na busca por soluções sustentáveis e comenta suas expectativas sobre a COP30
Diretor de Sustentabilidade, Novos Negócios e Relações Institucionais da Tereos no Brasil, Felipe Mendes atua em um momento decisivo para o avanço de práticas sustentáveis no setor. Com uma trajetória sólida dentro da companhia, onde ingressou em 2007 para integrar a equipe responsável pelo IPO da Tereos no Brasil, ele tem liderado iniciativas estratégicas voltadas à inovação, transição energética e fortalecimento do posicionamento institucional da empresa.
Administrador de empresas formado pelo Mackenzie, com MBA em Finanças pela FGV, Mendes acumula passagens por instituições como Bank Boston e Banco Itaú, além de ter iniciado sua carreira na SCA Etanol. Ao longo de sua jornada na Tereos, ocupou cargos nas áreas de Tesouraria e Novos Negócios, sendo nomeado diretor dessas frentes em 2019. Com especializações em Valuation (FIA), Relações com Investidores (Saint Paul Institute of Finance) e Fusões e Aquisições (INSPER), ele combina visão estratégica e técnica para impulsionar o papel da Tereos na construção de um futuro mais sustentável.
1. Quais são suas expectativas para a COP30? Como esse evento pode envolver mais o setor privado na transição ecológica?
A realização da COP30 no Brasil coloca o país no centro das discussões climáticas globais, fortalecendo a busca por soluções inovadoras e sustentáveis. O evento representa uma oportunidade estratégica para posicionar o Brasil como protagonista da transição energética, aproveitando nossos diferenciais, como uma matriz energética majoritariamente renovável e a liderança em bioenergia sustentável.
É também uma vitrine para que empresas e instituições brasileiras apresentem seus avanços, projetos e metas ambientais, atraindo investimentos e firmando parcerias que impulsionem iniciativas em sustentabilidade. Setores como bioenergia, agricultura regenerativa e infraestrutura verde reforçam o papel único do Brasil como fornecedor de soluções climáticas em escala global.
O evento será ainda uma chance importante de destacar a contribuição do agronegócio brasileiro na mitigação das mudanças climáticas. Com tecnologia e inovação, é possível aliar produtividade à preservação ambiental, consolidando o país como referência em práticas agrícolas sustentáveis.
Acreditamos que a COP30 pode fortalecer o Brasil como um polo global de investimentos em uma economia de baixo carbono e o engajamento ativo do setor empresarial, nacional e internacional, será essencial para transformar metas climáticas em resultados concretos.
2. Como as empresas da CCIFB podem contribuir para avançar nas metas de sustentabilidade? Que desafios você enxerga no meio corporativo?
As empresas associadas à CCIFB têm uma forte presença nos setores de energia, mobilidade, alimentos e bens de consumo. Isso as coloca em uma posição estratégica para escalar soluções sustentáveis, reduzir emissões, fomentar cadeias de valor responsáveis e incorporar práticas ESG em todas as suas operações. Além disso, estão cada vez mais comprometidas com iniciativas voltadas à preservação ambiental e à conservação da biodiversidade.
Entendo, no entanto, que um dos principais desafios no ambiente corporativo continua sendo conciliar a ambição climática com a viabilidade econômica — especialmente em cadeias produtivas longas e setores de difícil descarbonização.
Acreditamos também que uma regulação climática estável, com métricas padronizadas e instrumentos eficazes de financiamento e incentivo, pode ajudar a destravar gargalos e fortalecer uma agenda verde mais robusta e consistente.
Na Tereos, temos avançado de forma sólida em áreas-chave, como a rastreabilidade da nossa matéria-prima e a otimização do uso de recursos. Atualmente, quase 70% da nossa cana-de-açúcar total já é certificada, e conseguimos reduzir em 12% o consumo de água por tonelada desde 2017.
Um dos nossos principais compromissos é a descarbonização do nosso negócio. No ano passado, anunciamos nosso programa de neutralização das emissões de gases de efeito estufa (GEE) por meio do SBTi, com a meta de zerar nossas emissões até 2050.
Para alcançar esse objetivo, planejamos acelerar significativamente a transição energética ao longo dos próximos nove anos, por meio da redução do consumo de energia, do aumento da eficiência energética e da eletrificação dos processos produtivos. Nossa meta de médio prazo é reduzir, até 2032/33, 50% das emissões industriais e 36% das emissões agrícolas, em relação ao nosso baseline de 2022/23.
3. Na sua visão, por que a bioeconomia pode ser uma chave para o desenvolvimento sustentável no Brasil? O que falta para destravarmos esse potencial?
A bioeconomia oferece uma oportunidade única de aliar o uso eficiente dos recursos naturais agrícolas ao desenvolvimento econômico com menor impacto ambiental. Nenhum outro país reúne, em escala, uma combinação tão robusta de biodiversidade, base agroindustrial, expertise em bioenergia e agricultura de baixo carbono como o Brasil.
O país tem plenas condições de atender às demandas atuais e futuras por alimentos e energia, sem comprometer seus compromissos com a preservação ambiental e a conservação da vegetação nativa. Um exemplo disso é a meta anunciada pelo governo federal de recuperar cerca de 40 milhões de hectares de áreas degradadas ao longo da próxima década, convertendo-os em áreas produtivas.
Na Tereos, adotamos um modelo de economia circular, aproveitando 100% do potencial da cana-de-açúcar na produção de açúcar, etanol, bioenergia e outros coprodutos. Esses subprodutos são reintegrados às nossas operações ou comercializados, ampliando a eficiência e reduzindo o desperdício.
Acreditamos que, com o avanço da inovação e das novas tecnologias no campo, o uso crescente de fontes alternativas aos combustíveis fósseis e a otimização de recursos nas atividades agrícolas, é possível acelerar esse modelo e impulsionar um agronegócio cada vez mais sustentável.
Para que isso se concretize, tanto no Brasil quanto no cenário internacional, é fundamental contar com um marco regulatório claro, que valorize o carbono e recompense externalidades positivas, além de mecanismos de financiamento adequados e uma integração efetiva entre ciência, setor produtivo e governo. Essas são peças fundamentais para liberar o potencial da bioeconomia brasileira.